quarta-feira, 8 de junho de 2011

O PERIGO INVISÍVEL DAS INSTALAÇÕES ELÉTRICAS EM CANTEIROS DE OBRA

87.9% dos canteiros visitados tinham hastes cravadas em locais de permanência ou próximo ao trânsito de pessoas, partes vivas expostas, má organização e saturação do espaço interno dos quadros de distribuição.
A constatação é de uma pesquisa com 66 canteiros de obras de Recife realizada pela Escola Politécnica da Universidade de Pernambuco.
 O crescimento econômico do Brasil alavancou o número de construções em todo o território nacional, seja ele particular ou público. Não é difícil receber um folheto com o título: “a mais nova opção imobiliária”. A cada ano, novos edifícios são construídos prometendo ótimas opções de moradia ou de investimento. As ofertas, sempre sedutoras, prometem entregar o imóvel em poucos meses. No entanto,
para que a obra saia no tempo determinado e com a qualidade desejada pelo cliente, fatores importantes devem ser realizados pelas construtoras, mas que nem sempre são lembrados durante a execução da obra.
Os canteiros de obras, apesar de ter uma vida útil predeterminada – pois serão desfeitos ao término da construção principal -, prestam papel fundamental para o andamento da obra: iluminação do local, energia para a ligação de máquinas e outros equipamentos, além das redes de água e esgoto para a obra e os trabalhadores. O problema é que, muitas vezes, as instalações elétricas dos canteiros de obras são negligenciadas com a utilização de materiais de pouca qualidade e instalações mal projetadas. Normas como a NR 10, NR 18 e a ABNT NBR 5410 visam à proteção contra choques elétricos nas instalações elétricas nos canteiros de obras, mas nem sempre são respeitadas.
São Paulo é referência quando o assunto é grandes construções – a exemplo de edifícios como o Itália (com 165 m de altura) e o Copan, considerado a maior estrutura de concreto amado do Brasil. Apesar de tantas referências, a situação das instalações elétricas nos canteiros de obra ainda não pode ser sinônimo de qualidade. Para o engenheiro eletricista Cláudio Mardegan, da Engepower, grande parte dos acidentes envolvendo canteiros de obras está relacionada à negligência. “Detalhes simples como sinalização, iluminação noturna, cavalete e fita zebrada fazem a diferença e evitam significativamente o número de acidentes, mas por serem considerados ‘simples’ são deixados de lado”. Ele ressalta que empresas de médio e grande portes normalmente cumprem as exigências técnicas de segurança, respeitando as normas técnicas, mas as pequenas empresas não tem esse tipo de preocupação. A mão de obra barata ocasiona a contratação de profissionais desqualificados e despreparados, intensificando o risco de acidentes.
O diretor da área de materiais e tecnologia do Sinduscon-MG e superintendente de obras da Construtora Castor, Cantídio Alvim Drumond, tema mesma opinião quando o assunto são as pequenas construtoras. “Com o ‘bum’ da construção civil, médicos, dentistas, mecânicos, qualquer um se diz construtor de obras”, diz. Drumond afirma que o número de acidentes envolvendo instalações elétricas entre as 360 empresas associadas ao Sinduscon-MG é praticamente zero, mas acabam levando a má fama por causa dos acidentes envolvendo empresas de pequeno porte. “Foi o tempo em que instalações provisórias eram sinônimas de gambiarras. O problema é que as poucas denúncias que acontecem dentro das pequenas empresas são publicadas de forma deturpada e acabam representando a maioria das construtoras”, avalia.
Na região Nordeste do País, a situação não parece tão tranqüila. Em recente trabalho, o engenheiro eletricista Sérgio Braga identificou que, em Pernambuco, 50% das mortes envolvendo a indústria da construção são ocasionadas pelas instalações elétricas dos canteiros de obras. Segundo ele, a ausência de projeto e de esquemas unifilares assim como o desconhecimento e o desrespeito das normas técnicas e DCE segurança ocasionam esse tipo de acidente. A manutenção das instalações elétricas também é primordial para evitar a má conservação ou envelhecimento dos circuitos elétricos. O Laboratório de Segurança e Higiene do Trabalho, da escola Politécnica da Universidade de Pernambuco, pesquisou 66 canteiros de obras da região metropolitana de Recife e identificou fatores que intensificam o número de acidentes da região, tais como: 87,9% dos canteiros visitados tinham as hastes de aterramento cravadas em locais de permanência ou próximo ao trânsito de pessoas, além da exposição das partes vivas perigosas, da má organização e da saturação do espaço internos dos quadros de distribuição.
A escassez da mão de obra no setor elétrico está em permanente discussão, seja ele técnico ou acadêmico. Para Cláudio Mardegan, Cantídio Drumond e Sérgio Braga esse é o ponto crucial para que o problema nas instalações elétricas seja parcialmente solucionado. Mesmo tendo sua própria equipe na Construtora Castor, quando necessário Drumond utiliza mão de obra terceirizada e avalia: “quando esses funcionários chegam aos campos de trabalho, percebemos o despreparo em lidar com situações do cotidiano. É quando solicitamos que a empresa faça uma reciclagem para que eles possam retornar e seguir o trabalho”.
O instalador da Eletrodublin Engenharia, localizadas em Caieiras (SP), defende os funcionários. “Hoje em dia as empresas não contratam mais pessoas sem curso e qualificação, o que nos obriga a buscar o conhecimento, afinal, nosso objetivo é sempre fazer um serviço perfeito, mas seguimos ordens. O cliente quer produção, dificilmente segue as normas, não realiza a manutenção necessária nas instalações dos canteiros, pois sabe que aquilo é provisório e que logo será desmontado”, revela.
Uma questão, entretanto, fundamental para a segurança dessas instalações é a fiscalização. “O número de técnicos de segurança disponíveis no mercado não é suficiente para o número de obras, o que não permite que eles fiquem full time nas construções”, explica Cláudio Mardegam. Cenário parecido acontece em Brasília, segundo o presidente da comissão de materiais e tecnologia do Sinduscon-DF e diretor técnico em engenharia da Itebra Construções Instalações Técnicas, Dionysio Klavdianos. “Não há como um técnico de segurança ficar 24 horas em uma obra”, justifica. Em Belo Horizonte, Drumond descreve outro cenário: “em qualquer obra realizada pela Castor, há um técnico de segurança que fica disponível durante todo o período de trabalho, sem mencionar a equipe médica que também fica à disposição dos funcionários. Em Minas Gerais, a fiscalização do Ministério do Trabalho é muito rigorosa”, conclui.
Com o objetivo de alinhar os conhecimentos, anualmente, a Câmara Brasileira da Construção (CBIC) organiza o Encontro Nacional de Construção (ENIC), reunindo diversas regionais dos sindicatos da construção e outras associações com o objetivo de trocar experiências e alinhar as diversas formas de trabalho disponíveis no Brasil. Em Belo Horizonte (MG), recentemente o Grupo de Intercâmbio da Construção Civil – Tecnologia (GICC-TEC), criado pelo Sinduscon-MG, elaborou a Qualimat, uma cartilha que objetiva padronizar e utilização, a qualificação e a inspeção de diversos materiais, visando a qualificação do manuseio de diversos tipos de ferramentas, o que pode contribuir para a redução do número de acidentes e aumentar a preparação técnica dos funcionários.


Por Grasiele Maia
Artigo publicado na Revista O Setor Elétrico, ed. 60, janeiro de 2011.

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